Os desafios do mercado de arroz após a colheita: o que você precisa saber
Entenda quais as etapas que o produtor precisa cumprir para assegurar maior competitividade ao setor
Cada uma das etapas da cadeia produtiva do arroz tem efeito nos custos, nos preços e na qualidade do arroz. O cenário de mercado mostra muitos avanços na etapa de produção de grãos nas lavouras, mas eles não são acompanhados na etapa de pós-colheita, causando estrangulamentos na recepção e na secagem, segundo o engenheiro agrônomo e professor Moacir Cardoso Elias, Doutor em Agronomia pela Universidade Federal de Pelotas e Mestre em Tecnologia dos Alimentos pela Universidade Estadual de Campinas. O desafio a ser enfrentado pelo produtor é diminuir perdas e preservar qualidade com armazenamento adequado como forma de aumentar a competitividade da cadeia.
“Armazenar não é somente carregar e descarregar os silos ou armazéns. São necessárias operações e atividades como inspeções, amostragens, análises, verificações por termometria, controles de pragas, aerações, transilagens, intra-silagem, resfriamento, prevenção da condensação interna e eventualmente retificações de limpeza e/ou de secagem”, explica o professor. “Antes da industrialização, os grãos são armazenados vivos, num ecossistema extremamente interativo, por isso a gestão da qualidade exige amostragens periódicas e monitoramento por análises e observações criteriosas”, complementa.
Protocolo pós-colheita
As operações de pós-colheita constam no protocolo recomendado pelo LABGRÃOS-DCTA-FAEM-UFPEL para a cadeia do arroz, englobando conceitos e procedimentos de boas práticas tecnológicas na pós-colheita. Confira a seguir algumas das recomendações!
Antes de mais nada, é fundamental ter segurança sobre a colheita ser realizada no momento próprio e de forma adequada, pois o retardamento e as danificações mecânicas podem determinar que sejam colhidos grãos com qualidade já comprometida ou com pré-disposição para grandes perdas durante o armazenamento. A umidade recomendada para a colheita do arroz depende do genótipo, da região produtora e do sistema de produção, mas em geral é entre 18 e 23%, evitando a colheita quando houver orvalho ou logo após a chuva.
Máquinas, equipamentos e determinadores de umidade devem estar bem conservados e regulados, não devendo haver misturas de grãos de cultivares ou híbridos diferentes, para não prejudicar o beneficiamento industrial. Arroz de marachas ou taipas não deve ser misturado ao de quadros ou quarteirões, enquanto não estiver seco e limpo.
Transporte e desafios logísticos
Devem ser feitas inspeções periódicas nos veículos de transportes dos grãos, para evitar que ocorram perdas de arroz por vazamento ou derramamento. Em condições adversas de temperatura e/ou de tempo de transporte, deve haver controle da temperatura dos grãos, com realização de movimentação e/ou ventilação em caso de verificar aquecimento. Deve ser feita adequada limpeza do transportador, para que resíduos de uma carga não contaminem outras.
Grãos úmidos não devem ser expostos ao sol, nem mantidos abafados sob lona no caminhão e nem devem ser submetidos a longas esperas até a secagem, principalmente para evitar a ocorrência de danos latentes que reduzem a qualidade do arroz durante o armazenamento e/ou a industrialização.
Recepção dos grãos
Na recepção, a primeira operação que deve ser realizada é a verificação documental, para evitar trocas ou desvios de cargas ou mesmo recebimento de cargas irregularmente adquiridas. Sendo verificada a licitude e a procedência da carga, devem então ser realizadas amostragens e análises de acordo com as Normas do Ministério da Agricultura. De preferência, devem ser recebidos e mantidos separadamente os grãos de cada cultivar ou híbrido e sempre que a temperatura dos grãos ultrapassar os 20ºC, principalmente se antes da secagem, o arroz deve ser imediatamente aerado ou resfriado, devendo ser iniciada a secagem até 24 ou no máximo até 48 horas após a colheita.
Não devem ser deixados os grãos úmidos na moega, sem aeração, por período superior a 12 horas.
A importância da pré-limpeza
Para melhor eficiência na operação de pré-limpeza, a escolha do jogo de peneiras deve ser criteriosa. Além disso, devem ser ajustados os fluxos de ar e de grãos na máquina de pré-limpeza, procedendo inspeções periódicas do equipamento, com análises tanto dos grãos como das impurezas descartadas. Para grãos armazenados na propriedade, sem comercialização imediata, a pré-limpeza deve ser mais seletiva, deixando teores de impurezas e matérias estranhas menores do que 3%. Se for para comercialização em prazo curto, deve ser feita pré-limpeza até 3-5% de impurezas e matérias estranhas antes de secar e depois realizar operação de limpeza até reduzir a 1%, armazenando os grãos quando já estiverem limpos.
Enquanto não for secado, mas, após pré-limpo, o arroz deve ser mantido em temperatura baixa, o que pode ser obtido por aeração com ar ambiente se as condições ambientais assim o permitirem, ou por resfriamento com ar artificialmente preparado, permanecendo nos reguladores de fluxo ou silos-pulmões sem aquecimento antes da secagem.
Métodos de secagem
Respeitando-se os parâmetros técnicos e operacionais, a secagem pode ser realizada nos sistemas, processos e/ou métodos que utilizem ar não aquecido, (também denominados métodos de secagem com ar natural, com ar ambiente ou com ar frio) ou naqueles com ar aquecido (também denominados métodos de secagem artificial ou forçada).
Se forem usados combustíveis sólidos (lenhas, cascas, restos de cultura) para aquecimento do ar de secagem, é recomendável evitar o contato direto do ar da fornalha com os grãos, devendo ser tomados muitos cuidados com o controle térmico da operação, em função da inércia térmica, da maior desuniformidade de aquecimento do ar e da possibilidade de contaminação dos grãos com hidrocarbonetos heterocíclicos em níveis que podem ser prejudiciais à saúde dos consumidores. Se for utilizado GLP (gás liquefeito de petróleo) ou outro combustível fluido, deve haver monitoramento por sistemas automatizados de controle da temperatura e/ou da umidade relativa do ar.
Em secagem estacionária, realizada em silo secador, é mais recomendável fazer o monitoramento do condicionamento do ar por controle de umidade relativa do que por controle de temperatura, para reduzir a desuniformidades na secagem.
Deve ser evitada a lentidão da secagem quando utilizar ar não aquecido, pois o arroz pode adquirir danos latentes que se manifestarão em perdas de qualidade dos grãos durante o armazenamento. Não é conveniente encher o silo para depois secar, sendo recomendável fazer a secagem em camadas que não ultrapassem 1,50 m na espessura da camada de grãos. Após a secagem de cada camada, essa pode ser removida para um silo de armazenamento definitivo, ou ser sobreposta por outra(s), caso em que deve ser diminuída a temperatura do ar a cada nova camada sobreposta colocada no silo.
Os choques térmicos predispõem os grãos às quebras e à ocorrência de danos metabólicos durante o armazenamento, aumentando a incidência de defeitos e reduzindo sua conservabilidade.
No caso de seca-aeração, 16% e 40ºC são, respectivamente, a umidade e a temperatura máximas com que os grãos podem sair do secador convencional, devendo ser submetido a repouso por 4 a 8 horas no silo-secador para a etapa estacionária, antes da insuflação do ar ambiente, em fluxo de até 1m3.t-1.min-1, a qual pode ser feita com o silo já cheio.
Para grandes quantidades, ou quando há necessidade de rapidez, os sistemas intermitentes, a secagem escalonada ou a secagem sequencial são mais recomendáveis para secagem de arroz, devendo ser evitada a remoção brusca da água, a qual deve ser harmônica durante todo o processo e não deve ultrapassar a dois pontos percentuais por hora, em cada hora. É preferível utilizar secagem gradual, com ar em temperaturas crescentes, ao invés do sistema tradicional, desde que sem choque térmico e sem superaquecimento dos grãos.
Armazenamento nos silos ou nos armazéns
É preferível carregar os silos ou os armazéns graneleiros com grãos já resfriados. Não sendo possível, pode-se carregar até 1 metro de altura do silo ou armazém com grãos parcialmente resfriados, devendo ser ligado o sistema de ventilação e a partir desse momento, com o ventilador ligado, ir colocando os grãos diretamente no silo, sem resfriamento prévio, desde que não haja correntes de ar frio no transporte do secador até o silo.
No armazenamento, é preferível que os grãos apresentem umidade entre 11 e 13% (dependendo da região e do tempo em que ficarão armazenados). Os grãos devem ser mantidos com temperaturas mais baixas possíveis, por resfriamento entre 14 e 16ºC, ou por aeração com ar na condição ambiente, a fim de dispersar, remover ou distribuir a umidade e o calor acumulados. Diariamente, à mesma hora, deve ser medida a temperatura em vários pontos.
Se houver aquecimento dos grãos, deve ser ligado o ventilador quando o aumento se situar entre 3 e 5ºC medidos pela termometria, desligando quando resfriar e a diferença não ultrapassar 2ºC, a não ser nos casos de armazenamento de grãos com resfriamento em sistemas que controlem simultaneamente temperatura e umidade relativa do ar.
Em armazenamento refrigerado, o metabolismo dos grãos e dos organismos associados é bastante reduzido e os focos de anaerobiose praticamente não ocorrem, pois o consumo de oxigênio intergranular é baixo. Em temperaturas inferiores a 16ºC a atividade metabólica é muito lenta e não há reprodução de insetos.
A instalação de exaustores para evitar a condensação interna de água nos silos auxilia em muito a uniformidade da temperatura dos grãos, reduzindo as correntes convectivas, melhorando a preservação da qualidade dos grãos e diminuindo os gastos com energia na aeração durante o armazenamento.
Boas condições de higiene e sanidade no armazenamento são fundamentais para a conservação dos grãos. Aparecendo pragas, qualquer que seja a população, deve ser realizado expurgo de acordo com o Receituário Agronômico e sob a orientação, supervisão e responsabilidade técnica do engenheiro agrônomo que emitir a receita, considerando as informações técnicas pertinentes.
“Já se foi o tempo em que armazenar arroz era sinônimo de guardar. Nos conceitos atuais, armazenar significa guardar preservando a quantidade, a qualidade e a sanidade dos grãos. Também já se foi o tempo do amadorismo, havendo cada vez mais necessidade de profissionalismo com conhecimento para haver bom êxito na atividade”, conclui o professor.
Gostou do conteúdo? Se quiser saber mais sobre o assunto, confira o podcast complementar a este texto que gravamos com o professor Moacir Elias.
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